segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Cogência

Quem sabe se o seguinte argumento é cogente e porquê?

Alguns portugueses são católicos.
Logo, alguns católicos são portugueses.

Podem deixar as vossas respostas na caixa de comentários.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A Filosofia, nas palavras de Rui Cunha

O grupo de professores de Filosofia da ESMTG no ano lectivo de 2006-2007. 
Rui Cunha é o primeiro da esquerda

Foi com tristeza que soube da morte de um excelente colega e amigo, que também foi professor de Filosofia nesta escola no ano lectivo de 2006-2007. Em memória de Rui Cunha, deixo aqui as palavras com que inicia o seu livro Existência, Sentido e Inferência (Arquimedes Livros, 2007).

Toda a filosofia consiste em propor teses, sejam elas epistemológicas, ontológicas, semânticas, estética, éticas, etc., e aduzir argumentos a favor, respectivamente contra, essas teses propostas. Qualquer tese deve ser formulada clara e concisamente, dado que crucial na sua eventual refutação é a produção de contra-exemplos [...]
Essas teses têm origem em problemas filosóficos, para os quais pretendem constituir soluções. Torna-se fundamental poder testar a validade dos argumentos apresentados em defesa dessas teses, para o que se torna imprescindível a existência de um método de análise desses argumentos. A lógica elementar, ao apresentar um cânone de regras de inferência válidas [...] fornece justamente uma base para esse método. 

Obrigado, Rui.

domingo, 17 de outubro de 2010

Duas ideias erradas acerca dos argumentos

Uma confusão muito frequente acerca dos argumentos é pensar que eles existem algures por aí e que nós nos limitamos a descobri-los. Mas isso é falso. Os argumentos não são como os cogumelos, que surgem por aí e que apenas temos de apanhá-los. Somos nós que criamos os argumentos quando procuramos defender, com razões, uma dada ideia ou opinião. E somos também nós que decidimos, quando discutimos ideias com os outros, se queremos ou não argumentar e, portanto, se as nossas afirmações constituem um argumento ou não. Mas, uma vez tomada a decisão de argumentar, isso é publicamente observável.

Algumas pessoas pensam, também erradamente, que a finalidade da argumentação em filosofia é ver quem ganha a discussão ou quem é mais inteligente. Mas a filosofia não está ao serviço de tais futilidades; os filósofos argumentam porque estão interessados na verdade.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Omnipotência

Há perguntas que nos deixam muitas vezes sem saber o que pensar. No teste diagnóstico que se encontra no início do manual A Arte de Pensar, do 10º ano, é feita uma pergunta para a qual alguns alunos nem sequer sabem como começar a responder, embora achem que há ali qualquer coisa que não bate certo. A finalidade da pergunta é precisamente a de deixar os alunos perplexos. Diz o seguinte: Poderá um ser omnipotente, como Deus, criar uma pedra tão pesada que ninguém a possa levantar?

Bom, quando se fala de «ninguém», isso inclui o próprio ser omnipotente. A pergunta parece conduzir-nos à ideia de que há algo de errado com a própria ideia de omnipotência e, por consequência, algo de errado também com a ideia de um deus omnipotente. Será?

Vamos tentar reformular a pergunta, para ver se compreendemos melhor o que está em causa. Proponho que se reformule da seguinte maneira: Será que um ser omnipotente pode criar algo que não possa criar?

Pois, se esta for uma reformulação correcta da nossa pergunta inicial, parece ficar mais claro que o problema talvez não seja a resposta, mas o que se pede na própria pergunta. Seria mais ou menos como perguntar se um ser que sabe tudo também sabe coisas que não sabe; ou que consegue criar coisas redondas que são quadradas.

No livro Que Diria Sócrates, organizado pelo filósofo Alexander George, alguns filósofos respondem a perguntas filosóficas de pessoas comuns. Deixo aqui um excerto do livro com a mesma pergunta, respondida pelo filósofo Richard Heck.

Pode Deus fazer uma pedra tão pesada que Ele próprio seja incapaz de a levantar? Se pode, então não é todo-poderoso. Mas se não a puder fazer, então também não será todo-poderoso. Em qualquer destes casos, temos uma coisa que Deus não consegue fazer. Assim, parece seguir-se que Deus (ou qualquer outra coisa, para o efeito) não pode ser omnipotente. 
RICHARD HECK: Apresenta-nos uma versão de um problema antigo, um problema que é incessantemente discutido por teólogos. Na sua formulação mais simples, diz o seguinte: Pode Deus fazer uma pedra que seja simultaneamente grande e não grande? É óbvio que não. Logo, Deus não é omnipotente.
A resposta mais conhecida a esta questão, favorecida por Tomás de Aquino, é que temos de ter mais atenção quanto ao modo como entendemos o conceito de omnipotência. Ser omnipotente não é ser capaz de fazer seja o que for: é ser capaz de fazer tudo o que é possível ser feito. Poderia Deus fazer uma pedra que fosse simultaneamente grande e não grande? Não. Mas o facto de Deus ser incapaz de o fazer não ameaça a omnipotência de Deus, uma vez que jamais seria possível existir uma pedra que fosse ao mesmo tempo grande e não grande. De igual modo, se Deus é omnipotente, então é simplesmente impossível existir uma pedra tão grande que Ele não possa levantá-la. Assim, o facto de Deus não poder criar uma pedra tão grande que Ele não possa levantá-la não constitui um limite ao poder de Deus.
Vale a pena referir também que alguns filósofos – René Descartes, por exemplo – defenderam que Deus poderia fazer uma pedra que fosse simultaneamente grande e não grande! Segundo esta perspectiva, os poderes de Deus são completamente ilimitados, a ponto de Deus não estar sequer limitado pelas leis da lógica. Pode ser impossível, para nós, compreender como se consegue tal feito, mas esta incompreensão deve-se ao facto de as nossas mentes serem finitas, sendo a do Criador infinita.